Saiba quais são os próximos passos caso Gladson Cameli seja afastado do governo do Acre


PGR aponta fraudes ou direcionamento em pelo menos oito contratos firmados nos últimos anos pelo governo do estado, com prejuízo estimado de R$ 150 milhões. Decisão do afastamento ou não de Gladson Cameli cabe à ministra Nancy Andrighi. Gladson Cameli foi reconduzido ao cargo de governador do Acre em 1º de janeiro deste ano
Diego Gurgel/Secom
O pedido feito pela Procuradoria-Geral da República (PGR) para que o governador do Acre, Gladson Cameli (PP), seja imediatamente afastado do cargo ainda deve ser analisado pela ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Nancy Andrighi. Caso a ministra confirme o afastamento, quem assume é a vice-governadora Mailza Assis, também do Partido Progressistas.
Entenda os detalhes de cada etapa a seguir:
Decisão é publicada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) após parecer da ministra Nancy Andrighi;
Vice Mailza Assis (PP) assume o cargo;
Decisão é publicada no Diário Oficial do Estado (DOE);
Gladson Cameli pode recorrer da decisão;
Vale destacar ainda que:
Não há um prazo em específico para que a ministra divulgue o parecer;
O g1 conversou com André Rosa, cientista político e professor do Centro Universitário do Distrito Federal (UDF), que explicou que a imagem da vice pode crescer por estar no exercício do governo. Ele disse ainda que, do ponto de vista da ciência política, isto pode alavancar a imagem dela no cenário político.
Rosa avaliou também que, apesar de não se ter uma ideia se a ministra decidirá ou não pelo afastamento, é importante verificar o contexto ao qual Cameli está inserido e se escândalos políticos estão ou não desgastando a imagem do chefe do Executivo. Isto pode até potencializar o surgimento de novos personagens na política, segundo o cientista.
“A melhor forma de análise do momento atual é identificar o cenário que esses atores estão envolvidos, os problemas que estão enfrentando em termos de desafios e a própria comunidade, o próprio estado como um todo, observar os interesses desses atores políticos que estão surfando na onda do governador que está sendo afastado”, disse.
“É o que a gente chama na ciência política, que a elite é circulante. Então a elite começa a circular a partir deste momento em que o governador é afastado. Tem chance de novos nomes da política aparecer na região”, frisou.
Quem assume o governo caso Gladson Cameli seja afastado?
Mailza Assis da Silva, atual vice-governadora, é a primeira na linha de sucessão do Executivo estadual. Natural de Mundo Novo, do Mato Grosso do Sul, ela tem 46 anos e integrou a chapa de reeleição do governador Gladson Cameli, eleita para a gestão 2023-2026. Assim como Cameli, ela também é filiada ao Partido Progressistas.
Gladson comemorou ao lado de sua vice, Mailza Assis da Silva
Aline Nascimento/g1
A política tomou maior projeção na carreira de política quando foi eleita primeira suplente na chapa de Gladson Cameli, que disputava a única vaga do estado no Senado Federal. Mailza assumiu a cadeira em 2019, permanecendo por quatro anos. Inclusive, durante este período, foi presidente estadual do Progressistas e líder da bancada do partido no Senado.
Em 2022, Mailza foi convidada por Gladson para compor a chapa de reeleição ao governo do Acre, ficando na vaga anteriormente ocupada por Major Rocha, que estava no primeiro mandato.
Suposto esquema
A denúncia da PGR aponta que a empresa Murano Construções e empresas subcontratadas – sendo o irmão do governador, Gledson Cameli, um dos sócios dessa empresa – teriam pagado propina ao chefe do Executivo estadual em valores que superam os R$ 6,1 milhões, por meio do pagamento de parcelas de um apartamento em bairro nobre de São Paulo e de um carro de luxo.
“Embora a denúncia trate apenas dos crimes praticados no âmbito do contrato firmado pelo governo estadual do Acre com a empresa Murano, há provas de que o esquema se manteve mesmo após o encerramento da contratação. Foram identificados oito contratos com ilegalidades, e a estimativa é que os prejuízos aos cofres públicos alcancem quase R$ 150 milhões”, diz o Ministério Público Federal (MPF).
A Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu ao Superior Tribunal de Justiça (STF) que o governador do Acre, Gladson Cameli (PP), seja imediatamente afastado do cargo.
Ao longo de quase 200 páginas, o MPF apresenta amplo material probatório dos crimes praticados e que tiveram como ponto de partida a fraude licitatória, o que consistiu na adesão da Secretaria de Infraestrutura e Desenvolvimento Urbano do Estado do Acre a uma ata de registro de preços vencida pela empresa Murano, que tem sede em Brasília (DF), e nunca havia prestado serviços no Estado do Acre.
O objeto da licitação feita pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano (campus Ceres /GO) era a prestação de “serviços comuns de engenharia referentes à manutenção predial”. Já no Acre, a empresa foi responsável pela execução de grandes obras rodoviárias, tarefas executadas, conforme a denúncia, por companhias subcontratadas, uma delas a Rio Negro Construções, que tem como sócio Gledson Cameli, irmão do governador.
Em nota, o governador Gladson Cameli disse que confia na justiça, que se mantém à disposição para quaisquer esclarecimentos e continua com sua agenda na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-28), que ocorre em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, entre 30 de novembro e 12 de dezembro.
“Diante das publicações recentes veiculadas na imprensa acreana e nacional acerca de denúncia da Procuradoria-Geral da República, e, consequente, pedido de afastamento do exercício do mandato, o governador Gladson Cameli mantém sua confiança na Justiça, mantendo-se à disposição para quaisquer esclarecimento, bem como permanece cumprindo suas obrigações como chefe do Poder Executivo do Estado do Acre.”
Escândalos
Gladson de Lima Cameli (PP) e outras doze pessoas são suspeitas pelos crimes de organização criminosa, corrupção nas modalidades ativa e passiva, peculato, lavagem de dinheiro e fraude a licitação. Iniciadas em 2019, as práticas ilícitas descritas na denúncia teriam causado prejuízos de quase R$ 11,7 milhões aos cofres públicos. Além da condenação de forma proporcional à participação individual no esquema criminoso, o subprocurador-geral da República Carlos Frederico Santos pediu o afastamento do governador até o fim da instrução criminal. Somadas, as penas pelos crimes podem ultrapassar 40 anos de reclusão.
A denúncia foi apresentada ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), foro para processamento de autoridades como governadores, e está restrita a um dos fatos apurados na Operação Ptolomeu: irregularidades envolvendo a contratação fraudulenta da empresa Murano Construções LTDA, que teria recebido R$ 18 milhões dos cofres públicos para a realização de obras de engenharia viária e de edificação. Além do governador, também foram denunciados a ex-mulher de Cameli, dois irmãos do chefe do Poder Executivo, servidores públicos, empresários e pessoas que teriam atuado como “laranjas” no esquema.
O que o MPF pede
Em relação ao governador, o MPF pede que ele responda por dispensa indevida de licitação (art. 89 da Lei 8666/93), peculato (nesse caso, praticado por 31 vezes), corrupção passiva, lavagem de dinheiro (46 vezes) e organização criminosa. Quanto aos demais, foi requerida condenação considerando a imputação individual. Além disso, há pedido para que a decisão judicial decrete a perda da função pública de todos os que se enquadram na situação, incluindo o governador, além do pagamento de indenização mínima e R$ 11.785.020,31, conforme previsão do Código de Processo Penal.
Diante da gravidade dos fatos e da necessidade de resguardar a instrução processual e as demais frentes investigativas, o MPF pediu o afastamento cautelar das funções públicas do governador e demais agentes públicos denunciados até o fim da instrução criminal, além da proibição de contato entre os denunciados, que também não poderão se aproximar da sede do governo estadual. O MPF ainda pede que seja determinado bloqueio cautelar de bens dos denunciados de forma solidária até o valor de R$ 12 milhões, para assegurar a reparação ao erário em caso de futuras condenações. Os pedidos serão analisados pela relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi.
Quem é Gladson Cameli, governador do Acre
Ptolomeu: entenda
O inquérito foi aberto pela Polícia Federal em julho de 2021 baseado em outras operações da polícia, que, segundo o relatório, mostravam a ligação do governador do Acre, Gladson Cameli, em algumas movimentações. O Relatório de Inteligência Financeira (RIF) teria apontado, a princípio, 35 comunicações de operações financeiras suspeitas e, destas, 20 possuíam Cameli como titular ou envolvido.
Entre essas movimentações estavam:
compra de cinco carros de luxo, entre eles uma BMW X4;
três lotes em um condomínio fechado e considerado de luxo em Rio Branco;
uma tentativa de comprar um apartamento no valor de mais de R$ 5 milhões.
Qual seria a participação de Gladson Cameli?
A investigação da PF, que desencadeou a 1ª fase da Operação Ptolomeu em dezembro de 2021, mostrou que o governador do Acre, Gladson Cameli, seria o principal beneficiário do suposto esquema de corrupção no alto escalão da gestão. A PF aponta ainda episódios de superfaturamento, propina, empresas fantasmas e movimentações bancárias com altos valores.
PF aponta que governador seria principal beneficiário de suposto esquema de corrupção no AC
No inquérito detalhado, obtido pelo g1, a PF aponta que o esquema era dividido em núcleos compostos pelo próprio governador Gladson Cameli (Progressistas), a ex primeira-dama do Estado, Ana Paula Cameli, servidores públicos que ocupavam cargos de confiança no governo e empreiteiras da família Cameli, que atuam no Acre e também em Manaus.
Quais os resultados da 1ª fase da operação?
No dia 16 de dezembro de 2021, a PF, com apoio da Controladoria-Geral da União (CGU), deflagrou a primeira fase da Operação Ptolomeu, e cumpriu 41 mandados de busca e apreensão e um mandado de prisão no Acre, Amazonas e Distrito Federal. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), que autorizou a operação, determinou o afastamento das funções públicas dos envolvidos.
Nessa fase foram apreendidos, segundo a PF:
Seis veículos, estimados em R$ 1,7 milhão;
R$ 600 mil em espécie, entre dólares, euros e reais;
33 relógios e 10 joias de alto valor, totalizando mais de R$ 1 milhão, aproximadamente;
R$139 mil em celulares apreendidos.
O apartamento do governador do estado, Gladson Cameli (PP) foi um dos locais onde as buscas foram realizadas na época. Além disso, os policiais estiveram no escritório do governador; Palácio Rio Branco e Casa Civil.
Além do governador, servidores públicos do Acre e familiares do gestor em Manaus (AM) foram alvos da operação.
Também em 2021, Gladson Cameli afirmou que tinha a consciência “tranquila” e que a polícia estava cumprindo seu papel de apurar denúncias.
“Quem não deve, não teme. Não devo, não temo e quero que fique até o final, se tiver coisa errada vai para a rua [o servidor] e tem que prestar contas à sociedade, porque é dinheiro público”, disse à época.
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O que desencadeou a 2ª fase?
Na 2ª fase, deflagrada no dia 22 de dezembro de 2021, a PF informou que foi detectado que servidores públicos, entre os quais a então coordenadora de gabinete do governo do Acre, Rosângela Gama, estavam obstruindo a investigação, na tentativa de destruir provas essenciais para a continuidade das apurações, após a deflagração da 1ª fase.
Um vídeo, que a Rede Amazônica teve acesso com exclusividade, mostrava as investigadas ocultando celulares durante a deflagração da 1ª fase da ação. Foi com base nesse vídeo que a PF pediu a prisão de Rosângela.
Além do mandado de prisão contra ela, a polícia cumpriu cinco mandados de busca e apreensão em Rio Branco, em endereços relacionados aos envolvidos.
Rosângela foi solta na noite de 3 de fevereiro de 2022 após passar alguns dias internada no Hospital Santa Juliana, na capital acreana, tratando a Covid-19. Em fevereiro deste ano, ela foi nomeada assessora técnica de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-AC) com salário de mais de R$ 11 mil.
Sobre a segunda fase da operação, o governo do Acre se posicionou, por meio de nota na época, e disse que “o governador Gladson Cameli mais uma vez manifesta respeito, bem como colabora com todos os passos da investigação, de modo que fique esclarecido que o governo sempre agiu dentro da legalidade e do interesse público.”
O que aconteceu na 3ª fase?
Após mais de um ano desde a última fase da operação, policiais federais começaram a cumprir, em março deste ano, 89 mandados de busca e apreensão em seis estados e no Distrito Federal em mais um desdobramento da Ptolomeu.
A “Ptolomeu III” foi deflagrada a partir de investigações da Polícia Federal, da Procuradoria-Geral da República, da Receita Federal e da Controladoria-Geral da União. Os nomes dos alvos não foram divulgados.
O pai de Gladson, Eladio Cameli, e um irmão do governador, Gledson Cameli, também são investigados na operação.
Os mandados nesta fase são cumpridos no Acre, no Amazonas, em Goiás, no Piauí, no Paraná, em Rondônia e no Distrito Federal.
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Arquivo
Qual objetivo da terceira fase da operação?
Nesta nova fase, o objetivo é bloquear bens para, no futuro, ressarcir os cofres públicos.
O STJ determinou o bloqueio de R$ 120 milhões em bens dos investigados, incluindo valores em contas bancárias, aeronaves, casas e apartamentos de luxo. Segundo a PF, o cumprimento dos mandados envolve mais de 300 policiais federais nesta quinta.
Além do bloqueio dos itens de luxo, a decisão do STJ prevê:
31 afastamentos de cargo ou função pública;
57 proibições de contato com investigados e acesso a órgãos públicos;
57 entregas de passaporte;
70 quebras de sigilo bancário e fiscal;
15 empresas com atividades econômicas suspensas.
A PF e a PGR não divulgaram quem são os alvos de cada uma dessas medidas. A operação tramita em sigilo no STJ.
Qual esquema a operação tenta desarticular?
De acordo com material divulgado pela CGU, a operação tenta desarticular uma “organização criminosa especializada em fraudar contratações públicas”. Há suspeita de que recursos da saúde, da educação e do BNDES para obras de infraestrutura e serviços de manutenção tenham sido desviados.
A CGU e a PF identificaram “superfaturamento e inexecução contratual em pelo menos quatro contratos com empresas da área de construção civil”.
Essas empresas receberam, desde 2019, mais de R$ 268,6 milhões em recursos públicos.​​​​ As evidências apontam uma série de condutas irregulares, incluindo:
uso de sócios ocultos para disfarçar a conexão das empresas com servidores públicos envolvidos nas contratações;
movimentações de altos valores em espécie (dinheiro vivo);
operação de “smurfing” – divisão das quantias em uma série de transações menores em contas correntes para não chamar a atenção dos órgãos de controle.
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