O que é o Conselho de Direitos Humanos da ONU e o que significa retirada dos EUA e de Israel do órgão


Após EUA, Israel anunciou nesta quinta (6) que também vai se retirar do Conselho de Direitos Humanos, órgão da ONU que monitora e investiga casos de descumprimento dos direitos humanos no mundo. Decisões são mais políticas do que práticas, mas transparência dos países que saíram fica comprometida. Conselho de Direitos Humanos da ONU reunido em Genebra, na Suíça.
Reprodução/UN Web TV
Após os Estados Unidos, Israel anunciou nesta quinta-feira (6) o Conselho de Direitos Humanos (CDH) da ONU que se retirará do órgão. A saída de Israel do CDH ocorre apenas dois dias depois de o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, também ter feito o mesmo (Leia mais abaixo).
Embora o relator da ONU para a Palestina tenha considerado as retiradas “extremamente graves”, os movimentos têm mais efeitos políticos do que práticos, já que não os países-membros não obrigados a aderir às resoluções do conselho.
Ainda assim, a saída significa também uma espécie de bloqueio a informações sobre direitos humanos nesses países.
Veja abaixo o que é o conselho e suas funções, e como a saída dos EUA e de Israel deve impactá-lo.
Criado em 2006, o CDH se dedica a fazer investigações, relatórios e votar resoluções relacionadas com o descumprimento dos direitos humanos em diferentes países, em casos que vão desde terrorismo ao genocídio, passando por persguição a povos originários, minorias étnicas ou religiosas, massacres e torturas.
Também realiza um relatório, a cada quatro anos, com a situação dos direitos humanos em todos os 193 países que integram a Organização das Nações Unidas (ONU).
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Qualquer caso envolvendo um possível desrespeito dos direitos humanos em qualquer país do mundo pode ser alvo de investigações, relatórios e votações do conselho. “Somos a única organização intergovernamental do mundo que responde a qualquer caso sobre direitos humanos no planeta”, diz o CDH em seu site.
Caso uma investigação própria detecte violações, uma resolução é votada. O grande desafio, no entanto, é que essas resoluções são não-vinculativas — ou seja, não há a obrigação de que o país alvo da resolução aplique as medidas determinadas pelo conselho.
Essa resolução, portanto, funciona mais como um posicionamento da ONU e um parâmetro para o país investigado.
Mas há uma série de outras questões prejudicadas com a retirada de um país. Esse país deixa, por exemplo, de reportar casos ou de ser obrigado a fornecer dados e informações a alguma investigação em curso.
Os países-membros também fazem intercâmbios de informações, e as investigações são feitas com a ajuda de especialistas em direitos humanos independentes dos países-membros.
O conselho faz parte da ONU e tem 47 países-membros. O número é pequeno porque os membros são eleitos para mandatos bienais. O Brasil é atualmente um país-membro e tem mandato que vai até 2026.
Dentro desses mandatos, os membros se reúnem três vezes ao ano na sede do conselho, em Genebra, na Suíça, de forma fixa. Mas também podem fazer assembleias para debater e votar qualquer caso.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, destacou o papel crucial que o Conselho desempenha na arquitetura de direitos humanos da ONU, que é “a base da paz”.
EUA já se retiraram em 2018
Esta não é a primeira vez que os EUA deixam o conselho — em 2018, sob a primeira gestão de Trump, o país se retirou, mas acabou voltando.
A relatora especial da ONU, Francesca Albanese, afirmou que a retirada de Israel do Conselho de Direitos Humanos é “extremamente grave”.
“Isso demonstra arrogância e falta de reconhecimento do que eles [Israel] fizeram. Insistem em sua própria retidão, como se não tivessem nada pelo que prestar contas, e estão provando isso para toda a comunidade internacional”, disse Francesca Albanese à Reuters.
Albanese afirmou temer que “o genocídio de Israel contra os palestinos se expanda” e se intensifique agora na Cisjordânia —território ocupado que os palestinos querem, junto com Gaza, como o núcleo de um futuro Estado independente.
Investigada por acusações de genocídio na Corte Internacional de Justiça, Israel nega as acusações da prática na Faixa de Gaza e afirma que está protegendo seus legítimos interesses de segurança tanto na Cisjordânia quanto em Gaza, onde um cessar-fogo frágil está atualmente em vigor após uma guerra de 16 meses contra o grupo militante islâmico Hamas.
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Reuters/Elizabeth Frantz
O presidente Donald Trump assinou uma ordem executiva na terça-feira (4) que retirou os EUA do Conselho de Direitos Humanos da ONU e mantendo a suspensão do financiamento para a agência da entidade que fornece assistência para refugiados palestinos, a UNRWA.
Em um evento com a presença de jornalistas no Salão Oval da Casa Branca para a assinatura dos decretos, ele também afirmou que a única alternativa dos palestinos que vivem na Faixa de Gaza é deixar o território — uma ideia apoiada pela extrema direita israelense, e que constituiria limpeza étnica perante o direito internacional, segundo analistas.
Já a UNRWA foi estabelecida há cerca de 75 anos, atendendo cerca de 750 mil refugiados palestinos da guerra de 1948, durante a criação do Estado de Israel. Ela é a principal organização das Nações Unidas que fornece serviços de ajuda e educação a milhões de palestinos na Cisjordânia ocupada e em Gaza. Recentemente, Israel votou por encerrar o acordou que permitia o funcionamento de seus escritórios no país.
Mais tarde na terça, em encontro com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, Trump afirmou que os EUA “assumirão” Gaza no pós-guerra e reiterou o deslocamento dos palestinos que vivem no território. A fala foi amplamente repudiada pela comunidade internacional, o que fez a Casa Branca recuar.
No entanto, Trump insistiu na ideia nesta quinta-feira ao defender que Gaza seja entregue ao país e dizer que “seria um dos empreendimentos mais espetaculares da Terra”.
Destruição de Gaza
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O conflito entre Israel e Hamas, interrompido em janeiro por um acordo de cessar-fogo, gerou uma crise humanitária no território e deixou mais de 40 mil mortos.
Até o ano passado, os Estados Unidos afirmavam ser contra o deslocamento forçado de palestinos. O então presidente Joe Biden defendia a criação do Estado da Palestina e um acordo para convivência pacífica com Israel.
As falas de Trump levantam preocupações sobre uma saída generalizada de palestinos da Faixa de Gaza, o que poderia resultar no “apagamento” do grupo na região e enfraquecer a proposta para a criação do Estado da Palestina.
Trump conversou com o rei Abdullah da Jordânia neste sábado. Em entrevista a jornalistas, o presidente norte-americano afirmou que sugeriu que o monarca aceite palestinos no país, já que a Faixa de Gaza está uma “bagunça”.
No entanto, o ministro das Relações Exteriores da Jordânia, Ayman Safadi, reiterou a rejeição de seu país à proposta.
“Nossa rejeição ao deslocamento dos palestinos é firme e não mudará. A Jordânia é para os jordanianos e a Palestina é para os palestinos”, disse o chanceler.
A proposta de Trump foi elogiada pelo ministro das Finanças de Israel, Bezalel Smotrich, em um comunicado: “A ideia de ajudá-los a encontrar outros lugares para começar uma vida melhor é uma excelente ideia. Após anos de glorificação do terrorismo, (os palestinos) poderão estabelecer vidas novas e boas em outros lugares.”
Smotrich é um dos principais nomes da extrema direita no país, defensor da anexação total dos territórios palestinos por Israel e da criação de novos assentamentos israelenses, considerados ilegais pela ONU e pela maior parte da comunidade internacional.
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