Em meio à crise na segurança, Tarcísio cria comitê de discussão com PM, Polícia Civil e MP


Grupo tem o objetivo de discutir e recomendar a implementação de medidas e políticas públicas de segurança ao governador. Especialistas ouvidos pelo g1 veem com ressalva a medida e acreditam que o comitê pode ser utilizado politicamente. Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.
TON MOLINA/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO
Em meio aà crise na segurança pública em São Paulo, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) assinou um decreto para criar o Comitê de Assessoramento Estratégico de Segurança Pública (CAESP). A medida foi publicada no Diário Oficial nesta segunda-feira (10).
O grupo tem natureza consultiva com o objetivo de discutir e recomendar a implementação de medidas e políticas públicas de segurança ao governador.
Desde o final do ano passado, após a divulgação de uma série de casos de violência e letalidade policial (que inclui a morte de uma criança de quatro anos), Tarcísio vem deixando de lado o discurso linha-dura.
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Para especialistas ouvidos pelo g1, a criação do comitê faz desse processo de suavizar o posicionamento do governador em relação à segurança pública e trazer um olhar mais técnico para a pasta. Contudo, há dúvidas se o grupo é apenas um marketing político para as próximas eleições ou se de fato terá alguma efetividade. (Leia mais abaixo.)
O comitê será formado pelos seguintes membros: o Secretário da Segurança Pública, o Comandante-Geral da Polícia Militar, o Delegado-Geral da Polícia Civil, o Controlador Geral do Estado, o Procurador Geral do Estado, o Procurador-Geral de Justiça e o Defensor Público-Geral do Estado.
Órgãos e entidades públicas ou privadas da sociedade civil também poderão ser convidados para participar do grupo de discussão.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e o secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite, durante entrevista coletiva em julho de 2023.
RONALDO SILVA/PHOTOPRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
Segundo o decreto publicado no Diário Oficial, o CAESP terá as seguintes atribuições:
recomendar medidas, ações, protocolos e soluções de gestão e de informação na formulação de políticas públicas;
apoiar a implementação de ações, projetos e programas relacionados à temática de segurança pública;
informar o governador sobre o desenvolvimento e resultado das medidas relacionadas ao cumprimento do decreto.
O que dizem os especialistas
Apesar dessa mudança de discurso, a diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, aponta que estruturalmente Tarcísio não realizou nenhuma mudança na pasta de segurança pública e ainda manteve Guilherme Derrite (PL) — ex-capitão da Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (ROTA) — como secretário.
“Ele recuou um pouco ano passado em relação a essa visão e esse discurso mais linha-dura da política de segurança, embora não tenha mudado estruturalmente nada. Não trocou ninguém de cargo, o secretário, o chefe das polícias. Me parece que é um grupo para dar apoio a ele tanto técnico, mas sobretudo político”, afirma Ricardo.
Segundo a diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, também chama a atenção a presença da Defensoria Pública e do Ministério Público, que tem o papel de controle externo da polícia, no comitê.
“Então eventualmente pode ficar uma coisa um pouco contraditória, porque o controle externo pressupõe fiscalização, o monitoramento mais ativo. Então não sei se a função de assessorar e exercer o controle externo não pode ter algum conflito de interesse nessa história. Precisaria entender melhor o que se busca com esse assessoramento para que a função dessas duas organizações, sobretudo o MP, não se oponha”, explica Ricardo.
Para Rafael Alcadipani, membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e professor da FGV, inicialmente a criação do comitê é vista como positiva e uma forma de ampliar o debate técnico e mais profissional sobre segurança dentro do governo.
Entretanto, Alcadipani alerta que a comissão pode ser utilizada para fins eleitoreiro e político. Além disso, para o professor, Tarcísio quer se manter o apoio ao Derrite e, ao mesmo tempo, suavizar o discurso de segurança pública.
“Por um lado ele tenta montar um comitê mais profissional que tentar pensar e refletir em políticas para a segurança […] Ao mesmo tempo, o Tarcísio mantém um secretário que a gente sabe que tem dificuldade de diálogo com a sociedade civil, que tem uma visão bastante extremada sobre segurança pública, pouco científica. Então a impressão que dá é que ele está querendo jogar um pouco para a sociedade ter uma percepção mais positiva”, explica Alcadipani.
O integrante do FBSP também avalia que a criação do comitê enfraquece a imagem do secretário da Segurança, já que Derrite tem a reputação de ser “uma pessoa que resolver tudo [sozinho]” e isso “denota a necessidade de aperfeiçoamento da pasta de segurança pública”.
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TOMZÉ FONSECA/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
Ouvidoria paralela
Em dezembro, o governador de São Paulo anunciou a criação de uma segunda Ouvidoria da Polícia pela Secretaria da Segurança Pública.
O secretário Guilherme Derrite é quem indicará o ouvidor do órgão. O setor ainda contará com dois funcionários, podendo o quadro ampliado posteriormente, de acordo com necessidade, e um “Conselho de Usuários de Serviços Públicos”, coordenado pelo ouvidor da SSP.
A Secretaria diz que a nova ouvidoria teria atribuição diferente e não coincidente com a da atual ouvidoria, mas OAB vê sobreposição nos temas, o que pode enfraquecer mecanismos de controle e transparência da atividade policial no estado.
“A Resolução n. 66 da Secretaria da Segurança Pública aponta que a nova ouvidoria teria “atribuição diversa e não coincidente” com as da atual Ouvidoria das Polícias. No entanto, ao determinar a área de atuação do novo órgão, seu texto indica a sobreposição em temas centrais como: receber e sistematizar manifestações da sociedade, monitorar as ações das forças policiais e dar transparência ao sistema de segurança pública”, afirmou a OAB, em nota divulgada na época.
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