Prefeitura de SP volta atrás e diz que obra do prédio que desabou não estava embargada; construção tinha mais andares que o permitido


Embargo tinha sido divulgado pela Subprefeitura de Casa Verde após reportagem do g1 questionar o motivo de o prédio ter sido construído com mais de sete andares, uma vez que o alvará autorizava apenas três. Gestão Nunes diz que aplicou R$ 3,1 milhões em multas. Prédio que desabou na Zona Norte de SP estava autorizado a construir só três andares, mas tinha ao menos sete
A Prefeitura de São Paulo voltou atrás nesta sexta-feira (14) e disse que a obra que desabou na Vila Nova Cachoeirinha não estava embargada pela Subprefeitura de Casa Verde e Cachoeirinha, que cuida da área.
A informação do embargo tinha sido divulgada pelo próprio órgão na tarde desta quinta-feira (13), após a reportagem do g1 questionar o motivo do prédio ter sido construído com mais de sete andares, uma vez que o processo de licenciamento na Secretaria Municipal de Urbanismo (SMUL) autorizava apenas a construção de três andares (térreo mais dois pavimentos acima).
Segundo a Subprefeitura de Casa Verde, “o processo de fiscalização não havia sido devidamente concluído naquela data” de 24 de janeiro, quando uma multa de R$ 3,1 milhões foi aplicada no dono do imóvel e no engenheiro que é responsável técnico da obra.
“A Subprefeitura de Casa Verde e Cachoeirinha corrige a informação divulgada anteriormente de que havia embargado a obra em questão no dia 24 de janeiro. O processo de fiscalização não havia sido devidamente concluído naquela data. Vale ressaltar que, nesta quinta-feira, a prefeitura multou o proprietário e responsável técnico em mais de 3 milhões de reais”, disse a nova nota da gestão Ricardo Nunes (MDB).
O alvará para a execução da obra do empreendimento Residencial Condomínio Recanto, na rua Pedro Osório Filho, na Vila Nova Cachoeirinha, foi emitido pela SMUL no dia 5 de outubro de 2023.
Alvará da SMUL que permitia a construção de apenas três andares na obra da rua Pedro Osório Filho, na Vila Nova Cachoeirinha
Reprodução/TV Globo
A queda do edifício irregular em construção afetou ao menos cinco casas que estão interditadas pela Defesa Civil. Os vizinhos da obra que desabou contaram ao SP2 que não sabiam de nenhuma multa que havia sido aplicada pela Subprefeitura de Casa Verde no imóvel.
Eles já previam os riscos há tempos e disseram à reportagem que os operários trabalhavam sem equipamentos de proteção e, de longe, o prédio em construção parecia torto.
Os próprios vizinhos agora desabrigados denunciaram as irregularidades e os perigos várias vezes à Subprefeitura de Casa Verde e também abriram na Justiça uma ação para embargar a obra.
“Há meses a gente fala que essa construção tava irregular, porque eles subiram muito rápido a estrutura. A construção subiu muito rápido, tava tudo muito rápido. Só que durante a construção, ainda caiu alguns tijolos, cimento, em cima do telhados”, contou a publicitária Isabele Neri de Godoy Leite, que teve a casa atingida pelo desabamento.
A família dela abriu um processo contra o engenheiro Antônio Ricardo Ribeiro Júnior, responsável pela obra e o proprietário do empreendimento, Renato Robson de Souza. Eles pediam que a obra parasse imediatamente, mas o pedido foi negado.
Na decisão, a juíza alegou que “não há, em princípio nos autos, prova inequívoca das irregularidades na construção apontadas pela parte autora, à ensejar a imediata suspensão da obra”.
A negativa da Justiça e a negligência da subprefeitura custou caro para quem estava há meses tentando evitar o pior.
“Acabou com tudo. Desabou tudo em cima da minha casa… Acabou com sala, cozinha, quarto do meu filho, tudo, sobrou mais nada lá dentro”, disse o entregador Bruno Neri Marcondes de Godoy, que teve a casa destruída.
“Agora estou sem casa. Vou pra minha mãe, pra minha avó, não sei, mas o importante é que eu peguei meu gato, que é o mais importante pra mim. A roupa do corpo e o documento, é isso que a gente tem”, disse a analista de relacionamento Katherine Neri de Godoi Leite, que também teve a casa interditada.
“A única coisa que eu pude pegar foi meus documentos, botar um tênis pra não machucar meu pé, mas né, foi isso, eu tive que sair arrastando pelos escombros”, completou ela.
Projeto irregular
Depois e antes de prédio que desabou na Zona Norte de SP
Reprodução/Arquivo pessoal/TV Globo

Conforme o g1 publicou com exclusividade, o prédio que desabou na manhã desta quinta-feira (13) na Vila Nova Cachoeirinha, na Zona Norte de São Paulo, tinha autorização para a construção de apenas três andares de apartamentos, mas uma foto obtida pela TV Globo mostra que o edifício tinha mais que o dobro de andares erguidos no terreno.
O registro foi feito na última semana, antes do desabamento, por um morador da região. Nele, é possível ver a construção com pelo menos sete andares de altura.
A obra estava embargada desde 24 de janeiro deste ano, devido à construção de pavimentos acima do que era permitido, segundo a prefeitura da capital. Questionada pelo g1, a gestão municipal afirmou que foram aplicadas duas multas, ao proprietário e ao responsável técnico da obra, totalizadas em R$ 3,1 milhões.
Obra estava embargada desde janeiro por construção acima do limite e multa de R$ 3,1 milhões foi aplicada, diz Prefeitura de SP
Segundo os registros da prefeitura da capital, o dono do imóvel, Renato Robson de Souza, obteve o Alvará de Aprovação e Execução de Edificação Nova emitido pela Secretaria Municipal de Licenciamento e Urbanismo (SMUL) em outubro de 2023. O edifício recebeu o nome provisório de Residencial Recanto.
A autorização dada pela SMUL afirmava que, na área, seriam erguidos 30 apartamentos de 24 a 46 metros quadrados, nos três pavimentos autorizados pela gestão municipal (térreo mais dois andares).
Projeto do Residencial Recanto, na Vila Nova Cachoeirinha, registrado na Prefeitura de SP.
Reprodução
Segundo o engenheiro civil Roberto Racanicchi, muitas construtoras projetam um número de pavimentos acima do que se pretende erguer inicialmente, para ter fundação e infraestrutura capaz de aguentar se, depois de um tempo, o restante for construído.
O problema é quando se faz o contrário, com um projeto e uma infraestrutura para certo tipo de carregamento, depois de um tempo, resolve incluir outro(s) pavimento(s) que não estão previstos. Quando não há previsão nenhuma dessa carga, pode acontecer esse tipo de acidente, já que a carga se torna superior ao que o projeto suporta. Qualquer quantidade específica de pavimentos precisa ser prevista desde o projeto. Se houver uma diferença depois disso, implicará em risco de colapso
🔎 As causas do desabamento ainda serão investigadas, portanto, não é possível afirmar que a construção acima do previsto tenha relação direta com o ocorrido.
O engenheiro responsável pela obra é Antonio Ricardo Ribeiro Júnior, que tem registro ativo e regularizado no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de São Paulo(CREA-SP).
Questionado, o Crea-SP afirmou que está apurando a responsabilidade técnica sobre a edificação e notificará Antonio Ricardo para que o engenheiro apresente a documentação relativa à obra. O órgão disse ainda que abriu um processo administrativo preliminar para apurar se houve infração à legislação profissional.
A construção fica bem atrás do córrego Água Preta e parte do terreno, segundo laudos técnicos anexados no processo da solicitação do alvará, estava inserida em uma Área de Preservação Permanente.
O g1 procurou o proprietário e o responsável técnico pela obra, mas não recebeu retorno até a última atualização desta reportagem.
Laudo técnico anexado no processo da solicitação de alvará para construção do prédio na Vila Nova Cachoeirinha
Reprodução
Desabamento com feridos
Vídeo mostra momento que prédio desabou na Vila Nova Cachoeirinha, Zona Norte de SP
O edifício em construção desabou deixando ao menos dois feridos. Imagens feitas por moradores do entorno mostram uma nuvem de poeira que levantou após a queda do edifício (veja vídeos).
Segundo o Corpo de Bombeiros, uma das vítimas é um homem que teve fratura exposta na perna e foi levado ao Pronto Socorro do Mandaqui, em Santana, também na Zona Norte.
A outra pessoa teve apenas ferimentos superficiais e recusou atendimento no local. Ao todo, 11 viaturas dos bombeiros foram enviadas ao local, que fica na Rua Pedro Osório Filho.
Por nota, a Subprefeitura Casa Verde/Cachoeirinha informou que uma equipe foi enviada ao local do desabamento para fazer uma vistoria e avaliar as condições dos imóveis vizinhos.
Obra começou há 6 meses
Comerciante no bairro há 20 anos, o barbeiro Orlando D’Ávila contou ao g1 que a vizinhança tomou um susto com o barulho enorme na queda do prédio.
“Nós estávamos aqui pra dentro. De repente, ouvimos um barulho enorme e tudo tremeu. Aí, veio a nuvem de fumaça”, disse.
Imóvel desaba na Vila Nova Cachoeirinha, na Zona Norte de SP
O barbeiro contou que a obra tinha começado há cerca de seis meses e que muitos operários trabalhavam ali.
“Tinha muita gente trabalhando até o fim do ano passado. Mas, hoje, só tinha um vigilante, que ficou ferido. Não sei o motivo de eles não estarem hoje, mas foi por Deus que não estavam por lá. Porque poderia ter sido uma tragédia”, afirmou.
Imóvel desaba na Zona Norte de SP
Reprodução/TV Globo
Onde fica o prédio que desabou em SP nesta quinta
Arte/g1

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