Fake news contra jornalista mostram urgência de regular as redes

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Em tom sensacionalista, produtores de conteúdo espalharam por aí que uma mulher matou sozinha mais de 40 integrantes de uma mesma quadrilha distribuindo pasteis envenenados para a gangue. Você provavelmente recebeu algum vídeo do tipo.

Ou conhece quem recebeu.

A história era mesmo assombrosa.

Tanto que algumas postagens chegaram a mais de um milhão de visualizações.

Os vídeos eram baseados em um caso real, contada em uma reportagem do Portal iG assinado pela jornalista Marina Semensato. Mas, em vez de dar os créditos pela apuração, os difusores da história confundiram a autora do texto com a autora do assassinato e usaram uma foto de Maria nas postagens.

O “descuido”, claro, causou transtornos à jornalista. Afinal, ela noticiava uma guerra de facções. Fora do Brasil, mas uma guerra. E, por descuido, omissão ou má fé dos tiktokers, foi colocada no centro do conflito. O Portal iG foi a público esclarecer que está tomando providências contra os difusores da confusão.

O caso mostra a necessidade de tomar cuidado com o que seguimos, recebemos ou repassamos nas redes sociais. É bom sempre lembrar: a vida de alguém pode estar em risco.

Durante anos, a divulgação de notícias do tipo passavam pelos filtros e ferramentas do jornalismo profissional: elaboração de pauta, trabalho de campo, apuração, checagem, exatidão do texto.

Quem cometesse um erro crasso do tipo – publicar a foto errada de uma suspeita de um crime grave – provavelmente não voltaria a trabalhar no dia seguinte. O veículo, afinal, tem um nome a zelar e a credibilidade é a espinha dorsal do ofício.

As redes sociais bagunçaram tudo isso.

Pessoas sem formação, preparo, ferramentas ou noções jornalísticas básicas tem como chefes apenas os algoritmos. Quanto mais engajamento, melhor para eles. Mesmo que à custa da verdade e, quase sempre, da segurança de alguém.

Quando um caso como este acontece tão perto, a gente se lembra de questionar a quantas anda o PL das Fake News, já aprovado no Senado e que, por falta de acordo, dorme tranquilamente nas gavetas da Câmara.

Com apoio das grandes plataformas, detratores da proposta se negam a colocar o tema em debate por associá-lo à censura. Argumentam que as big techs são apenas a estrada por onde o crime é cometido e não podem fazer nada a respeito. Muitas vezes apenas fingem que fazem ou só fazem sob ordem da Justiça, o que custa a magistrados como Alexandre de Moraes, do STF, a pecha de censores.

Bem.

Qualquer estrada do Planeta possui regras e policiamento para regular desde limite de velocidade até infrações que podem deteriorar o tráfego ou colocar a vida de outras pessoas em risco. Uma plataforma digital não é, ou não deveria ser, diferente.

O problema é que poucos estão dispostos a mexer neste vespeiro. Há cerca de um mês, o governo federal voltou a defender a urgência da pauta.

A ideia é equilibrar três pontos principais: a responsabilização civil das plataformas; o dever de prevenção e precaução contra a disseminação de conteúdos ilegais e danosos a indivíduos ou a coletividades; e a mitigação dos chamados riscos sistêmicos.

A regulamentação ajudaria, por exemplo, a obrigar as plataformas a remover conteúdos falsos ou enganosos com mais rapidez e transparência.

Pode garantir também mecanismos de defesa e previsibilidade nas decisões das plataformas para os próprios usuários que cometam erros e queiram atuar dentro da legalidade.

Além do Congresso, o STF também tem na pauta a análise da regulamentação das redes.

Mas não parece ter pressa em tomar qualquer decisão ainda neste século, já que tem recorrentemente empurrado a análise do caso para um futuro próximo que nunca chega.

Até lá as redes sociais e os espertinhos que ganham dinheiro com cliques e sem canais de checagem – desmontados pelos donos das plataformas que querem é engajamento – seguirão destruindo eleições, a saúde pública e a segurança. Tudo impunemente.

Já é difícil demais, para um Estado-nação, encarar os donos das big techs, os atores mais ricos, poderosos, influentes do Planeta. Imagina lidar com eles sozinho ou sozinha?

*Este texto não reflete necessariamente a opinião do Portal iG

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