Terreiro acusa torcida organizada do Bahia de intolerância religiosa após pichação; grupo repudia ato e promete apuração


Casa de Oxumarê publicou uma nota de repúdio exigindo que a Torcida Organizada Bamor se retratasse e tomasse providências para conscientizar os membros do grupo. Torcida organizada picha Terreiro de candomblé após BA-VI
O terreiro Casa de Oxumarê – Ilê Oxumare Araka Axe Ogodo, localizado na Avenida Vasco da Gama, em Salvador, acusou membros da Torcida Organizada Bamor de intolerância religiosa. A acusação aconteceu após homens vestidos com blusas da torcida organizada picharem o muro do espaço religioso. Por meio de nota, divulgada nesta segunda-feira (19), a Bamor prometeu que o caso será apurado.
Em um vídeo, divulgado pela Casa de Oxumarê no domingo (18), é possível ver o momento em que o grupo de homens vestidos com camisas da torcida organizada picham o muro do terreiro. Os responsáveis pela depredação do espaço religioso estão acompanhados por um grupo enorme de torcedores, que descem a Avenida Vasco da Gama juntos.
Terreiro acusa torcida organizada do Bahia de intolerância religiosa após pichação
Reprodução/Casa de Oxumarê
Em nota, o terreiro afirmou que o ato de depredação foi cometido “sob o signo da intolerância e do desrespeito” e é um crime, já que o espaço é tombado como um patrimônio histórico e cultural do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
“Atos como este não se restringem ao concreto das paredes, eles ecoam no tecido social, perpetuam preconceitos e fortalecem as estruturas de racismo religioso que tanto lutamos para combater. Não é apenas uma pichação. Contribuem com as recorrentes tentativas de apagar símbolos da cultura negra, é a expressão de uma intolerância que se esconde em camadas de violência simbólica e física”, disse o texto. [Leia a nota na íntegra no final do texto]
Terreiro acusa torcida organizada do Bahia de intolerância religiosa após pichação
Reprodução/Redes sociais
A instituição religiosa exigiu ainda que a Bamor publicasse uma retratação pública e apresentasse medidas concretas para a conscientização dos membros do grupo. “Não se trata apenas de reparar um erro, mas de reafirmar o compromisso com os princípios éticos e com o respeito mútuo, bases essenciais para a convivência em sociedade”, pontuaram.
Torcida organizada do Bahia se posiciona
A Bamor publicou uma nota oficial sobre o caso nesta segunda-feira (19), por meio do Instagram. O grupo repudiou a atitude lamentável dos membros e reforçou que a ação não condiz com os princípios, valores e história da instituição.
“Diante da gravidade do ocorrido, informamos que iremos apurar os fatos com rigor e total responsabilidade, e caso seja constatada qualquer ligação de membros ativos ou associados com esse ato, serão tomadas todas as medidas cabíveis, conforme determina nosso estatuto”, prometeu o grupo.
Além de se disponibilizar para o diálogo, a Bamor reafirmou o compromisso com o respeito a todas as religiões. “A Torcida Bamor sempre prezou e continuará prezando pelo zelo de qualquer patrimônio público ou privado, bem como pela construção de uma sociedade mais justa e respeitosa”, enfatizou o grupo.
Confira na íntegra a nota da Bamor:
“A Torcida Bamor vem a público repudiar veementemente a atitude lamentável que está sendo divulgada pela mídia envolvendo a pichação em um terreiro de Candomblé. Reforçamos com absoluta firmeza que essa ação não condiz com os princípios, valores e a história da nossa Instituição.
A Bamor jamais será conivente com qualquer forma de intolerância religiosa ou desrespeito. Somos uma entidade composta por uma diversidade de membros, entre eles muitos que professam a fé do Candomblé e de outras religiões de matriz africana, todas merecedoras de respeito e liberdade de culto.
Diante da gravidade do ocorrido, informamos que iremos apurar os fatos com rigor e total responsabilidade, e caso seja constatada qualquer ligação de membros ativos ou associados com esse ato, serão tomadas todas as medidas cabíveis, conforme determina nosso estatuto.
Reafirmamos nosso compromisso com o respeito às religiões, à liberdade de crença e ao bem coletivo. A Torcida Bamor sempre prezou e continuará prezando pelo zelo de qualquer patrimônio público ou privado, bem como pela construção de uma sociedade mais justa e respeitosa.
Ressaltamos que nos encontramos à disposição para esclarecer qualquer dúvida que possa surgir e abertos ao diálogo sempre que necessário. Nosso compromisso é manter uma comunicação transparente e respeitosa, buscando sempre o entendimento e a melhor solução para todos.”
Confira nota da Casa de Oxumarê na íntegra:
“Ilé Osùmarè Araká Ase Ogodó
Casa de Oxumarê
Carta de conscientização sobre pichação da Torcida BAMOR no muro da Casa de Oxumarê
Salvador, 18 de maio de 2025
A Casa de Oxumarê – Ilê Oxumare Araka Axe Ogodo, um dos mais antigos e respeitados templos de Candomblé do Brasil, vem a público manifestar sua profunda indignação e repúdio ao ato de vandalismo cometido contra seu espaço sagrado. No último registro veiculado pelo site Alô Juca, imagens flagraram um integrante da Torcida Organizada Bamor (TOB) promovendo uma pichação em nosso muro, um ataque que não apenas fere as paredes físicas de nossa casa, mas também macula os alicerces de nossa fé, nossa ancestralidade e nossa história.
Fundada no século XIX, portanto bicentenária, a Casa de Oxumarê é um símbolo da resistência negra em solo baiano, uma guardiã dos saberes ancestrais e dos mistérios que atravessam gerações. Reconhecida como Patrimônio Cultural do Brasil, tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), desde 2013, e pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC), desde 2004, o llê representa um santuário de fé, tradição e luta pela preservação das raízes africanas em nosso país.
Este ato de depredação, cometido sob o signo da intolerância e do desrespeito, é um crime previsto na Lei Federal n° 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais), Art. 65, que criminaliza a pichação ou qualquer forma de destruição de bens tombados.
Mais do que um crime ambiental, trata-se de um atentado contra a liberdade religiosa, garantida pela Constituição Federal de 1988, em seu Art. 5°, inciso VI.
Atos como este não se restringem ao concreto das paredes, eles ecoam no tecido social, perpetuam preconceitos e fortalecem as estruturas de racismo religioso que tanto lutamos para combater. Não é apenas uma pichação. Contribuem com as recorrentes tentativas de apagar símbolos da cultura negra, é a expressão de uma intolerância que se esconde em camadas de violência simbólica e física.
A Casa de Oxumarê clama por respeito, ética e apela bons costumes! A destruição de um patrimônio sagrado revela a urgência de um compromisso coletivo com os valores que sustentam uma sociedade justa e harmônica. O respeito à diversidade religiosa, à cultura do povo negro e aos espaços sagrados é um dever de cada cidadão. Manter o diálogo e a convivência pacífica entre diferentes expressões de fé é um sinal de civilidade e dignidade humana.
Exigimos retratação pública por parte da Torcida Organizada Bamor, bem como medidas concretas para a conscientização de seus membros sobre o valor dos patrimônios afro-brasileiros e o respeito às religiões de matriz africana. Não se trata apenas de reparar um erro, mas de reafirmar o compromisso com os princípios éticos e com o respeito mútuo, bases essenciais para a convivência em sociedade.
Oxumarê é o orixá que renova, que traz o arco-íris após a tempestade. Que este episódio seja um marco para relembrarmos a importância da diversidade religiosa, do respeito ao sagrado e da proteção aos espaços de culto afro-brasileiros. Que a sabedoria dos nossos ancestrais guie nossos passos e fortaleça nossa resistência.
Resistiremos, como sempre fizemos, de pé e cantando para os Orixás.
Casa de Oxumarê – Ilê Oxumare Araka Axe Ogodo
Salvador – Bahia”
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