Entenda o impasse entre famílias atingidas pela alagação e prefeitura que levou a protestos com bloqueios no trânsito de Rio Branco


Prefeitura lançou o programa Recomeço para as Famílias, que prevê a entrega de móveis para moradores que tiveram residências atingidas pela cheia do Rio Acre, com critérios socioeconômicos e mapeamento da Defesa Civil. Moradores reivindicam direito a receber. Moradores chegaram a fechar a Rua Valdomiro Lopes novamente nesta terça-feira (28)
Aldo França/Rede Amazônica Acre
Durante esta semana, Rio Branco vivenciou momentos de caos no trânsito, especialmente no bairro da Paz. Isso porque moradores da região, que foram atingidos pela enxurrada de rios e igarapés no início do ano, fecharam a Rua Valdomiro Lopes na segunda-feira (27) e na terça-feira (28).
O grupo protesta contra a demora da entrega dos móveis e eletrodomésticos prometidos pela prefeitura. Por conta do ato, o trânsito na Estrada Dias Martins e na Avenida Ceará ficou congestionado. Equipes da Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito (RBTrans) auxiliaram os motoristas durante a interdição da passagem. O ato congestionou também o trânsito em outros pontos da cidade.
A autônoma Maria José Lima da Silva disse que, novamente, nenhuma equipe da prefeitura apareceu no local para dar uma explicação da demora na entrega. Ela destacou que um grupo de moradores vai até o Ministério Público do Acre (MP-AC) para denunciar a situação. “Ninguém da prefeitura falar com a gente, passamos o dia no sol com crianças e não aparece ninguém. O combinado é de que vai um grupo no Ministério Público e, caso não deem uma resposta, a gente vai fechar de novo”, afirmou.
Entenda abaixo os principais pontos da polêmica envolvendo o projeto e a situação dos moradores que não foram contemplados.
Enchente de rios e igarapés
Ruas alagadas pela água do Rio Acre acumulam lixo e entulho após vazante na capital
Juan Diaz/Arquivo pessoal
Após uma forte enxurrada que alagou diversos bairros de Rio Branco no dia 23 de março de 2023, o nível do Rio Acre saltou dos 9,76 metros para 14,65 metros no mesmo dia. Pelo menos 75 mil pessoas foram atingidas, 42 bairros alagados e mais de 3,3 mil famílias que precisaram ser levadas a abrigos públicos.
Neste ano, a maior cota registrada foi de 17,72 metros no dia 2 de abril e esta já é a terceira maior enchente da história desde 1971, quando ele começou a ser monitorado.
No total, mais de 15,4 mil moradores tiveram que deixar suas casas por conta da cheia do manancial. Além disso, 27 comunidades rurais ficaram isoladas, com mais de 1,8 mil famílias atingidas.
PL para entrega de materiais
Em abril, os vereadores aprovaram o projeto de lei complementar da prefeitura de Rio Branco que destina R$ 7 milhões para a compra de móveis, eletrodomésticos e outros itens às famílias que foram atingidas pela cheia do Rio Acre.
Para se habilitar a receber o benefício, os moradores devem atender aos seguintes critérios:
ter renda bruta familiar de até no máximo quatro salários-mínimos mensais;
possuir cadastro junto ao órgão gestor responsável pela política de assistência social no âmbito do município de Rio Branco
passar por avaliação socioeconômica e manifestação conclusiva expedidas pelos responsáveis técnicos do órgão gestor responsável pela política de assistência social atestando a situação de vulnerabilidade econômica temporária
O projeto traz ainda que é vedada a concessão de mais de um benefício a uma mesma família, independentemente do número de integrantes.
Em setembro, um decreto publicado pela prefeitura alterou os critérios, e passou a permitir a inclusão de famílias que ficaram abrigadas na casa de amigos, familiares e conhecidos por conta da cheia.
Primeira entrega
No dia 23 de outubro, pelo menos quatro mil famílias receberam móveis e eletrodomésticos por meio do Programa Recomeçar. Segundo a prefeitura, são mais de 17 mil móveis e eletrodomésticos. Segundo o prefeito Tião Bocalom, são camas, colchões, travesseiros, fogões, botijas de gás, televisão, tanquinhos, ventiladores, travesseiros, cama box conjugada de casal e solteiro, guarda-roupas e outros itens. As famílias beneficiadas foram selecionadas atendendo critérios nacionais para este tipo de situação.
No início de novembro, a seca do Rio Madeira em Rondônia causou o atraso na entrega de móveis e eletrodomésticos que seriam doados às famílias e as doações foram suspensas temporariamente.
Segundo a assessoria de comunicação da prefeitura, a entrega foi retomada nesta terça-feira (28) no Baixada da Sobral.
Protestos
Na segunda-feira (27), os moradores do bairro da Paz, em Rio Branco, atingidos pela enxurrada dos igarapés que cortam a cidade e transbordamento do Rio Acre fecharam a Rua Valdomiro Lopes em protesto contra a demora da entrega dos móveis e eletrodomésticos prometidos pela prefeitura. Na terça, o ato foi retomado.
A cabeleireira Juliane Maria da Rocha, 33 anos, mora na Rua Botafogo e disse que perdeu geladeira, fogão, cama de solteiro, cama de casal durante a enchente. Na época, ela ficou instalada na casa de parentes.
“Me deram um ventilador, a geladeira não. Tem pessoas aqui que não receberam nada”, resumiu.
Entrega não é para todos
Secretária explica sobre entrega de móveis para famílias atingidas por enxurrada
A prefeitura de Rio Branco não divulgou posicionamento oficial sobre os atos. Porém, em entrevista à Rede Amazônica, a secretária municipal de Assistência Social e Direitos Humanos, Suellen Araújo, explicou que a entrega não contempla todas as 17 mil famílias atingidas pela enchente.
Suellen ressalta que as famílias foram cadastradas ainda na época em que estavam desabrigadas, especialmente nos locais que serviram de abrigo, como o Parque de Exposições Wildy Viana e escolas.
“Nós fizemos os cadastros de quem estava no Parque de Exposições e nas escolas. Esses cadastros foram feitos, analisados e reavaliados conforme os nossos requisitos, que são de assistência social e direitos humanos. Infelizmente, vale ressaltar, não vai ser para todos. Nós tivemos requisitos socioeconômicos, questão financeira, mães solteiras, com crianças deficientes, idosos, então as casas que realmente foram atingidas. A nossa ficha de cadastro é um modelo federal, então não foi a assistência do município que criou, muito menos o estado. Nós trabalhamos com vulnerabilidade, então são famílias que realmente têm o perfil de assistência”, destacou.
Também em entrevista, o coordenador da Defesa Civil de Rio Branco. coronel Cláudio Falcão, também ressalta que o papel do órgão na execução do projeto foi de mapear as áreas atingidas e repassar à secretaria, para aplicação dos critérios.
Coronel Falcão relata ainda que a Defesa Civil iniciou, ainda à época da cheia, a entrega de kits humanitários de higiene e limpeza, e que essa entrega busca amenizar o deficit entre o total de pessoas atingidas e o número de contemplados pelo Recomeçar para as Famílias.
“Nós mapeamos todas essas áreas, e entregamos para a secretaria, para que com os critérios de assistência social seja feita essa entrega. As pessoas foram visitadas e cadastradas. No decorrer desse projeto, ocorreu a suspensão porque não recebemos os móveis a tempo, por conta dos rios. O projeto foi reiniciado, e a partir disso que está acontecendo o que estamos vendo. Estamos falando de 17 mil famílias atingidas, onde o projeto recomeço vai atender cerca de 3 mil famílias. Nós temos uma quantidade menor para atender do que a quantidade total, e nem todo mundo foi contemplado, mediante os critérios. Nos critérios da Defesa Civil, nós avaliamos famílias que foram desabrigadas e desalojadas. Contudo, repito, o critério é de assistência social, para definir quem vai ser atendido pelo Projeto Recomeço”, afirma.
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