Moradores se recusam a deixar casas inundadas em Rio Branco: ‘Tem que ter coragem’


Em Rio Branco, há quase 50 bairros atingidos pela cheia e mais de sete mil imóveis com fornecimento de energia suspenso. Muitos moradores seguem em casas alagadas. Moradores continuam em casa em área tomada pelo rio
Reprodução Rede Amazônica
Não é a primeira vez que a aposentada Aparecida dos Santos prefere continuar dentro de casa mesmo com a água dentro do imóvel. Ela tenta salvar os móveis e se recusa a deixar a casa no bairro Seis de Agosto, em Rio Branco, que teve a energia foi cortada. Já são 48 bairros atingidos pela cheia na capital.
👉 Contexto: Em todo o estado, pelo menos 27.919 pessoas estão fora de casa, dentre desabrigados e desalojados, segundo a última atualização feita pelo governo do estado nesta quarta (6). Além disso, 19 das 22 cidades acreanas estão em situação de emergência por conta do transbordo de rios e igarapés. Ao menos 23 comunidades indígenas no interior do Acre também sofrem com os efeitos das enchentes e quatro pessoas já morreram em decorrência da cheia.
Aposentada Aparecida dos Santos continua em casa inundada
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“É sufocante, sufocante, não é fácil não, aqui tem que ter coragem, tem que ser guerreira se não, não fica não. A outra alagação eu fiquei 14 dias aqui nesse mesmo canto e essa alagação to aqui no mesmo canto,” afirma.
Ela não é a única. O empreendedor Sebastião Barbosa mora no bairro Cadeia Velha, também continua em casa, e o pequeno comércio dele foi inundado.
“Eu não consigo trabalhar porque não tem onde botar nada, né? A situação fica difícil sem dinheiro pra trabalhar. Vem alguém aí, um abençoado que dê um sacolão, uma marmita pra gente jantar alguma coisa, é o que nós estamos esperando,” lamenta.
Sebastião Barbosa teve comércio invadido pelas águas
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O aposentado Antônio de Melo é cadeirante e ficou em casa, no bairro Cadeia Velha, até onde conseguiu. Mas, nesta terça-feira (5) teve que acionar o resgate e foi levado ao Parque de Exposições, principal abrigo da capital.
Aposentado Antônio de Melo é cadeirante e teve que pedir resgate
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“Esperei até o último momento pra sair, é muito difícil né, situação difícil, eu preciso fazer os curativos, todo dia eu tenho que fazer os curativos, tomar banho e lá pra Exposição eu não sei como vai ser,” afirma.
Defesa Civil estima 20 mil pessoas em áreas alagadas
Segundo o coordenador da Defesa Civil de Rio Branco, tenente-coronel Cláudio Falcão, não há, até o momento, um número exato de pessoas que continuam em casa mesmo vivendo em áreas alagadas. Ele estima, no entanto, que o quantitativo chegue a pelo menos 20 mil pessoas.
Falcão explica ainda o procedimento que tem sido adotado pelo órgão quando são identificadas situações como essa.
“Nós fazemos uma conversa de convencimento para que a pessoa saia. [Caso] ela se negue a sair, a gente faz uma avaliação de risco. Se for baixo ou médio, nós respeitamos o desejo da família e deixamos ela em casa”, explica.
Ele ressalta, no entanto, que caso a avaliação aponte que o risco de deixar alguém em uma determinada área é alto, a pessoa deve ser removida mesmo contra a vontade. “Mas assim, graças a Deus, a gente ainda não utilizou esse recurso”, enfatiza.
A Defesa Civil ainda tem, segundo ele, prestado assistência às famílias que estão em áreas alagadas levando cestas básicas e auxiliando na limpeza do dos locais.
Moradores atingidos recusam deixar casas alagadas
Cheia tira mais de 27 mil pessoas de casa
O nível do Rio Acre na capital acreana oscilou nas últimas 24 horas. Na manhã desta quarta-feira (6), a medição ficou em 17,84 metros, uma diminuição de dois centímetros em comparação com a medição de terça (5). No entanto, às 9h, o rio subiu cinco centímetros e chegou à maior marca deste ano: 17,89 metros.
Em Rio Branco, o rio continua acima dos 17 metros e segue próximo da maior cota histórica já registrada, que é de 18,40 metros em 2015. Essa já é a segunda maior cheia da história, desde que a medição começou a ser feita, em 1971.
Em 2024, já são 48 bairros e 18 comunidades rurais atingidos pela cheia em Rio Branco, e mais de 4 mil pessoas precisaram deixar suas casas segundo a prefeitura da capital, com dados desta quarta (6). A Energisa, companhia responsável pela distribuição de energia elétrica no Acre, já são mais de sete mil imóveis com fornecimento suspenso, cerca de 11 bairros.
Na segunda, o governo federal liberou mais de R$ 20 milhões para as ações de assistência aos atingidos pelas enchentes no Acre, na capital e no interior do estado. As portarias foram publicadas nas edições dos dias 29 de fevereiro e 4 de março, no Diário Oficial da União (DOU).
Da seca extrema à cheia histórica
Poucos meses separam o ápice de uma seca severa e a chegada de enchentes devastadoras no Acre. Para entender as crises sucessivas que levaram emergência para o estado é preciso considerar ao menos três fatores:
a influência do El Niño
o atraso do “inverno amazônico”, como é conhecida a estação chuvosa na região
o impacto do aquecimento do Oceano Atlântico
Juntos, os fenômenos climáticos fizeram o Rio Acre mudar completamente de panorama em um intervalo curto, entre o final do mês de fevereiro e o início de março. No dia 15, seu nível era de 7,06 metros. Já no dia 22, subiu 5,97 m metros no período de 24 horas em Assis Brasil, cidade por onde entra no país. E no dia 6 de março, já chegou aos 17,88 metros na capital, Rio Branco. Esse rio inundou sete cidades, incluindo que teve a maior enchente de sua história.
Colaborou Júnior Andrade, da Rede Amazônica Acre.
Cheia no Rio Acre atinge 7 municípios
Arte g1
VÍDEOS: g1

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