Febre entre adolescentes, França proíbe venda de cigarro eletrônico descartável

Projeto de lei francês passou por uma avaliação da Comissão Europeia, que aprovou globalmente os termos antes da votação final no Senado. A França aprovou uma lei que proíbe a venda e a distribuição do cigarro eletrônico descartável no país. Há anos a Liga contra o Câncer e outras entidades médicas denunciavam os riscos para a saúde do consumo de vapes descartáveis de sabores variados, uma febre entre os adolescentes franceses. Mas a lei demorou para ser votada, devido ao lobby exercido pela indústria do tabaco na Europa.
Na França, os adolescentes chamam o vape ou pod de “puff”. Apesar das advertências sobre a alta e rápida dependência que esses produtos à base de sais de nicotina criam no fumante, o Senado francês só conseguiu aprovar sua proibição definitiva nesta quinta-feira (13).
O projeto de lei francês passou por uma avaliação da Comissão Europeia, que aprovou globalmente os termos antes da votação final no Senado, mas recomendou excluir da lei francesa os cigarros eletrônicos recarregáveis, que continuam a ser vendidos nas tabacarias. 
Com essa legislação, a França se torna o segundo país no bloco europeu a proibir a venda do vape descartável, depois da Bélgica. O Reino Unido pretende proibir o comércio do produto até junho desse ano. O texto francês tem semelhanças com a regulamentação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), revista em abril de 2024 para incluir estudos recentes.
A fórmula dos vapes descartáveis, com aroma de menta, morango ou chocolate, à base de sais de nicotina, um derivado muito mais concentrado que a nicotina tradicional, potencializa a absorção dessa substância pelo organismo. Por isso, causa uma dependência precoce e intensa, segundo os médicos. 
Em 2023, uma pesquisa feita pela Aliança Contra o Tabaco mostrou que 15% dos adolescentes franceses de 13 a 16 anos já haviam usado vapes descartáveis e, destes consumidores, 47% disseram que começaram, em seguida, a fumar cigarros convencionais ou passaram para os cigarros eletrônicos recarregáveis. 
Círculo vicioso
Reportagens realizadas nesta sexta-feira (14) em colégios da região parisiense, para repercutir a proibição da venda dos vapes, mostrou fumantes, principalmente meninas de 12, 13, 14 anos de idade, nervosas com a perspectiva de não encontrar o produto à venda num futuro próximo. Algumas contaram que, depois de ficarem dependentes do vape, passaram a fumar cigarros e maconha.
O vape descartável irá sair das prateleiras das tabacarias francesas, mas a venda clandestina não deve desaparecer tão cedo. Os adolescentes que consomem o produto dizem que não compram o “puff” no comércio de rua por custar mais caro. Os preços por unidade variam de R$ 48,00 a R$ 120,00, dependendo do modelo. Os estudantes preferem se abastecer online ou com fornecedores pelas redes sociais por um preço mais em conta. O problema é que nessa relação, os adolescentes já são apresentados a outros produtos, como cigarros contrabandeados e maconha. 
O Comitê Nacional contra o Tabagismo (CNTC), uma associação independente, acredita que os fabricantes vão driblar a lei recém-aprovada e adaptar os vapes com aroma para aparelhos com um número limitado de recarga das baterias, para continuar atraindo os jovens ao consumo, uma vez que os aparelhos recarregáveis continuam autorizados. Essa indústria vive da dependência.
Em média, 200 pessoas morrem por dia na França por doenças decorrentes do tabagismo.
Problema de saúde pública e ambiental
Durante os debates na Assembleia e no Senado, os parlamentares discutiram estudos que mostram que a alta concentração de sais de nicotina, e de outras substâncias tóxicas encontradas nas fórmulas líquidas dos vapes, como o mercúrio, causam aumento da pressão arterial e alterações no sangue, com risco de infarto e de derrame cerebral, infecções e lesões pulmonares, e câncer a longo prazo. É um produto nocivo, viciante, que depois de um certo tempo de consumo requer ajuda médica para parar.
Além da questão de saúde pública, existe o aspecto ambiental, com as milhares de baterias à base de lítio que equipam esses aparelhos de uso único e acabam descartadas nas ruas e na natureza, causando poluição ambiental. Parlamentares ecologistas estiveram na iniciativa do projeto de lei. 
A ministra da Saúde e do Trabalho, Catherine Vautrin, disse que a aprovação unânime da lei pelos deputados e senadores demonstra “uma consciência coletiva” da necessidade de proteger os jovens. Mas falta um trabalho de polícia na cadeia de distribuição.
Novo canabinoide sintético preocupa autoridades
A Agência Francesa de Medicamentos (ANSM) publicou um alerta na semana passada sobre os “sérios riscos para a saúde” provocados por um canabinoide sintético conhecido como “Buddha Blue” ou “Explode Crânio”, como vem sendo chamado entre os franceses (PTC – Pète ton Crâne). 
Essa substância é vendida na forma líquida para inalação no cigarro eletrônico, que acelera seus efeitos. O usuário encontra o produto à venda nas redes sociais ou por meio de traficantes que rondam as saídas das escolas. Por enquanto, o consumo de “Buddha Blue” foi identificado nos arredores de escolas na região parisiense e no leste da França. O custo para um usuário frequente é de cerca de € 10,00, aproximadamente R$ 60,00, quatro vezes menos que alguns gramas de maconha. 
Os efeitos colaterais do “Buddha Blue” descritos pelos médicos são de arrepiar: alucinações, ataques de pânico, náusea, vômito, taquicardia, dor abdominal e no peito, problemas renais, amnésia, perda de consciência, convulsões, síndrome de abstinência. 
O monitoramento desse canabinoide sintético, iniciado em 2019, aponta 215 casos de intoxicação e uma morte na França. É mais um caso de fabricação e venda clandestina de um produto que imita uma droga e desperta a curiosidade dos jovens.
LEIA TAMBÉM:
Bookmark the permalink.